Maio - 2006

EDUCAÇÃO E O USO DE TECNOLOGIAS:
"QUEM SABE FAZ, QUEM COMPREENDE ENSINA"

     Incluir a aprendizagem conectada não é modernidade, é a realidade mundial. Devemos entender que a tecnologia avança na medida do avanço econômico, na medida das necessidades que o homem tem e cria novas ferramentas para avançar progressivamente. É falso pensarmos que as tecnologias empregues na e para a educação tiram os professores de cena e limitam a sensibilidade daqueles que a usam.
     Lembremos de Rubem Alves, quando tinha 60 e poucos anos, legou-nos "Estórias de quem gosta de ensinar" (Cortez, 1991), gosto muito de dialogar com o Rubem, com sua agitada calmaria, acredito que típica das pessoas amadurecidas e sábias, coloca-nos o ensinar como algo natural, simples e fácil, assim como deve ser o amor.
     Lá pela página 11 de seu livro, o Rubem nos diz assim: "Todo mundo reclama do fracasso da educação no Brasil. Os alunos de hoje não são como os alunos de antigamente. Nem mesmo sabem escrever. Que dizer do aprendizado da Ciência, esta coisa tão importante para o projeto Brasil grande potência? E eu fico a me perguntar se o problema não está justamente aqui. Um bem-te-vi que consiga ser aprovado com distinção na escola dos urubus (quem sabe com um daqueles Q.I.s de causar inveja?) pode ser muito inteligente para os urubus. Bem-te-vi é que ele não é". (ALVES, 1991, p. 11)
     Pensando bem, o Rubem tem razão, pois, "(...) para educar bem-te-vi é preciso gostar de bem-te-vi, respeitar seu gosto, não ter o projeto de transformá-lo em urubu. Um bem-te-vi será sempre um urubu de segunda categoria. Talvez para se repensar a educação e o futuro da Ciência, devêssemos começar não dos currículos-cardápios, mas do desejo do corpo que se oferece à educação. É isto: começar do desejo ... Conhecimento é coisa erótica, que engravida. Mas é preciso que o desejo faça o corpo se mover para o amor. Caso contrário, permanecem os olhos, impotentes e inúteis ... Para conhecer é preciso primeiro amar". (idem, ibid, p. 12-24).

     Então, sem uma grande paixão não há conhecimento? Sem a paixão pelas possibilidades que o novo pode proporcionar não há conhecimento?

     E por isso, talvez encontramos na rotina repetitiva "o jeito que a vida tem para dizer que tudo vai bem, que ela não está em perigo. Já a novidade que interrompe a monótona rotina binária é um sinal de alarme, sirene que toca, alerta de perigo, sempre acompanhada do susto e medo"(idem, p.43).
Permanecer com o que todos já sabem, ou podem facilmente saber, não é vantajoso, o professor deve ter em mente percorrer novas trilhas, mesmo que ela possa por acidente arranhar a "frágil bolha de sabão".
     O medo não ensina ninguém a aprender e a gostar de estudar. O prazer nos leva a estudar, pesquisar, investigar, perguntar, descobrir, provar, criar ... mas tudo isso, às vezes, acaba impróprio ao professor, afinal juramos lealdade "às idéias claras e distintas e aos símbolos unívocos (...)", o professor "gasta seu dia-a-dia iniciando discípulos nos não mistérios do mundo diurno, sol a pino, sem sombras e sem neblinas ..."(idem, pp. 75, 92 e 99).
     E tudo isso deve nos levar a perguntar: enquanto educadores queremos urubu ou bem-te-vi nas salas de aulas, nas escolas, nas ruas, no país? É uma questão de opção, apenas.
     Pensemos na prática pedagógica, sabemos é universal e, como Maria Isabel da Cunha (2001) nos comenta, é "reforçada por anos de didática prescritiva, reforça as relações verticais e consagra o professor como um repassador (até com boas habilidades) de informações enquanto para o aluno fica a perspectiva da memória e da reprodução fidedigna. Este ritual da aula universitária revela uma concepção de conhecimento, de aprendizagem humana e, conseqüentemente, de sociedade. (...) A maioria dos professores não faz uma reflexão rigorosa sobre suas práticas e, como produto acabado dos processos que os formaram, repete os mesmos rituais que viveu" (p.81).

     Como poderemos avançar na qualidade e no compromisso do ensino?

     Nossas práticas devem ser emancipatórias, para isso pensemos em trabalhar com pesquisa em nossas salas. De algum modo é o que vocês tem feito quando percorrem a WEB, nos seus diversos metabuscadores atrás de uma ou várias informações,quando percorrem sites, livros, enciclopédias, revistas impressas.
     A pesquisa é trabalhar com dúvidas, o erro e a incerteza é que gabaritam os caminhos de uma investigação, aqui entra o professor como grande orientador da aprendizagem individual para a aprendizagem coletiva. Respeitando e oferecendo as condições básicas para o aluno produzir, isto é, ler, refletir, observar, catalogar, classificar, perguntar em tempo disponível.
     Ao professor hoje compete escolher entre a repetição e a dependência de seu aluno ou educar para a autonomia, a independência intelectual e social.
Lembrando que se fala todo o tempo de 'ensino com pesquisa', para isso ser verdadeiro temos de considerar nossos alunos capazes de produzirem suas experiências de aprendizagens, para isso é necessário um professor que saiba trabalhar com a dúvida, o novo, substituindo, assim, a velha resposta pronta às questões que os alunos nos colocam em salas de aula, pela difícil capacidade de reconstruirmos com nossos alunos o conhecimento.
     Tudo isso porque não existe pesquisa sem leitura do mundo real. Pois, é a partir do desafio da prática que nasce o conhecimento teórico, já que é da experimentação e da observação que desenvolvemos a reflexão e a análise.
     Portanto, entendo que inovar em educação é romper com o paradigma que domina a situação educacional, inanição intelectual. Compete-nos fazer avançar, entender e utilizar formas alternativas de trabalhar em classe que quebrem de alguma forma, em algumas situações com o tradicional (repete-memoriza e tira dez), por isso, também, não aceito somente agregarmos a tecnologia a aula, mas ser um auxiliar a emancipar com e por meio de tecnologias nossos professores e alunos para o desenvolvimento social do país.
     Ivani Fazenda, em "A pesquisa em educação e as transformações do conhecimento. Campinas: Papirus, 1995, p. 29-41), passa-nos a compreensão da dimensão didático-pedagógica de que durante "muito tempo os professores limitaram-se a mobilizar um saber disciplinar, assumindo-se fundamentalmente de conhecimento científico em história, em biologia ou em matemática. Não espanta que então, pela boca de Bernard Shaw, se lhes tenha lançado o insulto, de que ainda hoje se ouvem ecos: Quem sabe faz, quem não sabe ensina. Pretendia-se relacionar a entrada no professorado com um falhanço, nas áreas disciplinares de base. Para o ensino iam apenas os medíocres ... Lee Shulman criticou essa perspectiva, afirmando a necessidade de o professor conhecer a fundo a matéria que ensina, tendo sugerido um novo aforismo: Quem sabe faz; quem compreende ensina."

     Qual é a sua escolha? O que significa introduzir na vida do professor o uso destas tecnologias que nos possibilitam ir além de?

     O professor hoje que compreende o fato da educação continuada dele próprio, entenderá que a alfabetização tecnológica é necessária, pois ele está envolvido na escola e na sociedade, as tecnologias estão e fazem o mundo atual, portanto o saber lidar com estas ferramentas não é obrigatório, mas é o ideal para sua referência crítica e construtiva daquele que compreende o mundo a ponto de poder ensinar e aprender com um outro ser neste mundo.
     Compreendendo que com a capacitação do professor no uso das tecnologias poderá distinguir como, quando e por que são importantes e devem ser utilizadas no processo educativo. Permitindo que este mesmo professor não se sinta marginal à realidade de seu aluno, participando para se comprometer com a construção do conhecimento dele e dos alunos.
     É muito importante dizer agora que não se tem aqui a intenção da exaltação do uso da tecnologia de ensino ou no ensino de maneira que restrinja a exigência da competência intelectual dos professores, tornando-os puros manipuladores de ferramentas, ao contrário, a posição aqui é recuperar com as tecnologias o talento de incorporar as experiências vitais de todos os educadores com a utilização digna destes instrumentos.
     Ou seja, valorizar a qualidade do professor que conhece seus alunos, experiências, perspectivas de vida e profissão, suas realidades, para poder elaborar pedagogicamente dinâmicas que auxiliem o processo ensino-aprendizagem.
A Internet, os chats, as simulações, CD-ROM, as listas de discussão, as páginas web, os e-mails fazem parte destas experiências e da realidade, por isso devem ser incorporadas ao dia-a-dia da escola sob a regência de um profissional com competência intelectual: o professor.
     Muitos pensam que a utilização de tecnologias pode desumanizar o ensino. Pensar assim é mistificar a tecnologia, dar a ela um poder que não tem, a tecnologia é apenas um recurso a serviço do homem na trajetória da construção do conhecimento.

Portanto, o professor hoje pode negar esta ferramenta para uso na escola, seja em sua aula tradicional, seja em aulas a distância?

 

Nuria Pons Vilardell Camas
Mestre em Educação: Formação de Professores e Educação com Tecnologias (PUC-SP)
Doutoranda em Educação: Currículo- Educação com Tecnologias (PUC/SP)
Professora do curso de EAD na Prática – Cogeae (PUC/SP)